Cirurgia Bariátrica e Compulsão Alimentar: O Que Ninguém Te Conta
Conheci, há alguns anos, uma pessoa maravilhosa que decidiu fazer a cirurgia bariátrica. Vi de perto suas lutas, suas angústias e suas vitórias. No início, ela acreditava que a cirurgia resolveria tudo, que bastava reduzir o estômago para que a fome desaparecesse e os quilos fossem embora. Mas a realidade foi bem diferente. A comida, que antes era um refúgio emocional, continuava sendo uma tentação. O olhar atento e empático para sua jornada me fez escrever este artigo, para trazer informações que muitas vezes não são discutidas, mas que fazem toda a diferença para quem deseja fazer a cirurgia e para quem já passou por ela.

A decisão de realizar uma cirurgia bariátrica é carregada de esperanças, desafios e, muitas vezes, falta de informações importantes. O procedimento é frequentemente visto como a solução definitiva para a perda de peso, mas a realidade é que ele é apenas o começo de uma jornada complexa. A compulsão alimentar, um dos principais fatores que levam à obesidade, muitas vezes persiste após a cirurgia, exigindo um olhar mais profundo para o aspecto emocional e comportamental do paciente.
Tipos de Cirurgia Bariátrica
Atualmente, existem diferentes técnicas de cirurgia bariátrica, sendo as mais comuns:
Bypass Gástrico: Reduz o tamanho do estômago e altera a absorção dos alimentos.
Sleeve Gástrico: Remove parte do estômago, reduzindo a produção do hormônio da fome (grelina).
Banda Gástrica Ajustável: Coloca um anel no estômago para limitar a quantidade de comida ingerida.
Derivação Biliopancreática: Procedimento mais agressivo, que reduz drasticamente a absorção de nutrientes.
Cada uma dessas técnicas tem seus benefícios e desafios, sendo essencial um acompanhamento médico rigoroso no pré e pós-operatório.
O Pós-Operatório: Um Desafio Subestimado
Muitos pacientes acreditam que a cirurgia será a chave para uma nova vida, mas se deparam com dificuldades inesperadas. A necessidade de reposição de vitaminas, devido à menor absorção de nutrientes, é uma delas. Além disso, efeitos colaterais como queda de cabelo, fraqueza, tonturas e alterações no humor são comuns.
A reeducação alimentar é um dos aspectos mais críticos, mas também um dos mais negligenciados. Sem um trabalho consistente, muitos pacientes desenvolvem transtornos como bulimia (compensar os excessos com vômitos) ou mantêm padrões de compulsão alimentar, agora com alimentos mais calóricos e de fácil digestão, como doces e líquidos hipercalóricos.
A Avaliação Psicológica: Uma Exigência Médica
A comunidade médica reconhece que os desafios da cirurgia bariátrica vão além da questão física. Por isso, um dos critérios obrigatórios para a realização do procedimento é a Avaliação Psicológica, conduzida por um profissional qualificado. Esse processo tem como objetivo identificar possíveis transtornos alimentares, avaliar a estabilidade emocional do paciente e garantir que ele esteja preparado para as mudanças que virão. O laudo psicológico é um documento essencial para a liberação da cirurgia e, mais do que uma formalidade, é um passo fundamental para garantir que o paciente tenha os melhores resultados e consiga lidar com os desafios pós-operatórios.
A Importância da Psicoterapia
A relação com a comida não se resolve apenas com a alteração física do estômago. A compulsão alimentar está frequentemente ligada a questões emocionais e cognitivas. A Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) é uma das abordagens mais eficazes para ajudar os pacientes a identificarem gatilhos emocionais para a alimentação descontrolada e desenvolverem estratégias para lidar com a fome emocional.
Antes mesmo da cirurgia, a psicoterapia deve ser incorporada para que o paciente reconheça padrões de pensamento disfuncionais, como "só me sinto feliz quando como" ou "se estou estressado, preciso de comida". O trabalho psicológico permite uma mudança mais profunda e duradoura, potencializando os resultados tanto para a saúde física quanto para o bem-estar mental.
A cirurgia bariátrica pode ser um excelente recurso para a perda de peso, mas não é uma solução mágica. Sem a devida atenção à saúde mental e comportamental, os resultados podem ser frustrantes. A mudança de mentalidade, o acompanhamento psicológico e a reeducação alimentar são essenciais para que a transformação seja, de fato, completa.
Se você está considerando a cirurgia bariátrica ou já passou pelo procedimento, lembre-se: a jornada não é apenas sobre perder peso, mas sobre reconstruir sua relação com a comida e consigo mesmo.
Referências Bibliográficas
AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais - DSM-5. Porto Alegre: Artmed, 2014.
BECK, J. S. Terapia Cognitivo-Comportamental: Teoria e Prática. Porto Alegre: Artmed, 2013.
MACHADO, P. P. P. et al. Compulsão Alimentar: Teoria e Tratamento. São Paulo: Roca, 2018.
CORDÁS, T. A. Transtornos Alimentares: Uma Visão Geral. São Paulo: Manole, 2016.
FRIEDMAN, K. E.; ASHWELL, L. Behavioral Treatment of Obesity: A Comprehensive Handbook. New York: Guilford Press, 2018.
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